Outubro Rosa e a atuação do Ambulatório de Oncologia UNIFESP

Outubro é o mês de conscientização e combate ao Câncer de Mama, e, por conta disso, o Observatório Institucional de Enfermagem conversou com a equipe do Projeto de Extensão Universitária Acolhe-Onco para conhecer melhor a equipe multiprofissional e seu trabalho no combate dessa doença que acomete tantas mulheres brasileiras (e até mesmo alguns homens).

O câncer de mama é uma doença causada pela multiplicação desordenada de células da mama. É importante que as mulheres conheçam o seu corpo e observem suas mamas (seja no banho, no momento da troca de roupa ou em outra situação do cotidiano em que se sintam confortáveis), valorizando a descoberta casual de pequenas alterações mamárias no autocuidado do dia a dia.

Um nódulo ou outro sintoma suspeito nas mamas deve ser investigado para confirmar se é ou não câncer de mama. Quando a doença é diagnosticada no início, o tratamento tem maior potencial curativo. Por isso, é importante perder o preconceito com o câncer e o medo de um diagnóstico que será de grande ajuda para um tratamento menos invasivo e mais suportável. Se você foi diagnosticada(o) com câncer de mama, converse com uma equipe multidisciplinar, para juntos decidirem o melhor tratamento para você.

Quem nos recebeu para a conversa foi a Professora Dra Edvane De Domenico (docente da EPE, Coordenadora do Acolhe-Onco e do Programa de Residência Multiprofissional em Oncologia da Unifesp, PRMO- Unifesp) , a fisioterapeuta e profa. afiliada da UNIFESP Dra Samantha Rizzi (vice-coordenadora e tutora da Fisioterapia do PRMO- Unifesp), Dra. em Enfermagem Leila Martin (extensionista colaboradora do Acolhe-Onco), estudantes de graduação e os residentes do PRMO- Unifesp. 

Professora Girliani: Conte para nós como surgiu o trabalho multiprofissional no ambulatório de oncologia e a residência multi.

Professora Edvane: O Acolhe-Onco surgiu em 2008, inicialmente com o ambulatório de onco hematologia e a nossa proposta era integrar as consultas médicas e de enfermagem. A experiência foi bastante exitosa e fez com que expandíssemos para outros ambulatórios de oncologia. E, assim, nós fomos nos engajando nos ambulatórios possíveis dentro da nossa escala de serviço. Hoje nós acompanhamos os ambulatórios de oncologia geral e da onco hemato. Não são todos porque alguns acontecem no mesmo período e não temos um contingente de extensionistas, graduandos e residentes, o suficiente para abarcarmos a totalidade. A nossa intenção é dar materialidade à proposta do SUS. Nós acreditamos que o cuidado deve ser centrado na pessoa e  que esse cuidado só pode ser feito com a atuação multiprofissional, a partir de um  planejamento assistencial e que todos os profissionais devem refletir sobre como contribuir para aprimorar o que o SUS pode proporcionar. O que dispomos, em termos de  recursos, deve  estar a mercê da pessoa atendida. Tentamos fazer com que, mesmo nas adversidades, possamos dar um cuidado de qualidade e, no nosso dia a dia, verificamos que isso só é possível com a  integração do trabalho da residência multiprofissional junto à residência médica.

Nós proporcionamos um cenário para o  aprendizado dos formandos, sendo estes graduandos, residentes, mestrandos ou doutorandos. Vivenciar o que, na prática, é o cuidado, considerando a pessoa, suas diversas demandas e lembrando que essas demandas não estão restritas ao processo de adoecimento pelo câncer é o que valorizamos no dia-a-dia. O câncer é uma doença que está caracteristicamente vinculada com o envelhecimento populacional, mas também há muitas condições ambientais às quais nos expomos. O diagnóstico que ocorria antes aos 60 ou aos 70 anos hoje tem ocorrido aos 40 ou 50 anos de idade. Isso está relacionado às condições ambientais e hábitos sociais que são favorecedores da carcinogênese. Temos que ter um olhar para essa pessoa com mais de 60 anos mas também para a pessoa com câncer que está numa fase produtiva muito ativa.

Queremos que uma mensagem seja disseminada no Outubro Rosa: a importância do diagnóstico precoce. É lógico que quando a mulher sabe que terá acesso ao tratamento isso fortalece a busca pelo diagnóstico precoce. Mas a maioria das mulheres tem praticamente a certeza que aquele diagnóstico vai ser uma sentença. O que é importante nesse Outubro Rosa? Desmistificar a certeza da morte e do sofrimento no câncer. Não queremos ter um discurso que é esvaziado de sentido emocional, como se colocássemos o diagnóstico de câncer numa situação inofensiva emocionalmente. Nós sabemos que é um diagnóstico de uma doença que é grave e que precisa ser combatida com um arsenal terapêutico intenso. Nós dispomos de cirurgia, quimioterapia, radioterapia, de várias intervenções, isoladas ou combinadas, que a literatura tem mostrado que tem favorecido a sobrevivência ao câncer de mama. Queremos também no Outubro Rosa de 2022 ampliar a relação com a família dos pacientes. Queremos atingir não necessariamente nossos pacientes que estão com câncer, mas as outras pessoas da família. Já que o câncer de mama em apenas  1% dos casos acomete os homens, estamos falando com  99% da população de mulheres. Então, queremos atingir as mulheres dessas famílias que tratam o câncer. Porque, se conseguirmos acessar essas pessoas, pode ser que elas não sejam nossas pacientes no futuro… Principalmente pacientes em estado de doença avançada ao diagnóstico do câncer.

Temos um compromisso de levar para a população a mensagem que o câncer é sim uma doença grave mas que justamente por isso tem que ser diagnosticada precocemente. O diagnóstico precoce aumenta sobremaneira as condições física e emocional de uma paciente durante o tratamento. Além disso, no caso do câncer de mama, coloca essa mulher com quase 90% de chance de estar viva ou curada em 5 anos. É muita chance de sucesso! Queremos mulheres diagnosticadas com tumores com menos de 2 cm para o início do tratamento. Os tratamentos serão menos mutilantes, muito mais suportáveis e com uma sobrevivência a longo prazo, livre de doença, praticamente garantida.

Nosso trabalho multiprofissional tem o compromisso de oferecer informações de qualidade para a população e desmistificar o câncer.  

Girliani:  Como vocês vêem o trabalho do Outubro Rosa na atenção primária em saúde? O que vocês fazem enquanto residentes nessa perspectiva e quais são os avanços e potencialidades que a gente trabalha o Outubro Rosa na atenção primária à saúde?

Edvane: A atenção primária é o foco do R2 (residentes do segundo ano). A tarefa é trazer a preocupação com a detecção precoce. Alguns dados estatísticos mostraram que os números de casos diagnosticados de câncer de mama em 2019 foram o dobro do que em 2020. O que isso quer dizer? É um dado objetivo do represamento diagnóstico. Então, esse Outubro Rosa é muito importante. Apesar da  atenção das políticas públicas para  o câncer de mama, incluindo a compra de mamógrafos e  campanhas sucessivas do Ministério da Saúde, verifica-se que ainda há falhas no sistema, como dificuldade para agendamentos ou pouca resolutividade nos casos suspeitos, que desincentivam a busca por saúde pelas mulheres. 

Girliani: Quais dificuldades vocês têm na atenção primária em saúde? As mulheres buscam vocês? E, quando buscam, elas têm o exame clínico das mamas feito com qualidade e baseado nas evidências científicas?

Edvane:  Muitas mulheres chegam no ambulatório com uma história triste e difícil. Na doença oncológica, o tempo é um fator que também favorece o prognóstico e diminui o sofrimento físico e emocional. 

Samantha: Acredito que a psicologia pode ajudar no enfrentamento ao câncer porque as pessoas têm muito preconceito e medo com a doença. As pessoas dizem “quem procura, acha”. Mas quem acha, trata! Então é importante achar, e o quanto antes. Pois, apesar de termos uma lei que garante que a mulher faça uma biópsia em 30 dias, às vezes o resultado demora até dois meses para ficar pronto. Profissionais pouco capacitados podem não conseguir fazer o diagnóstico em pacientes fora do escopo. É o caso, por exemplo, de mulheres mais jovens que podem apresentar nódulos palpáveis nos seios, mas muitas vezes são negligenciadas pela falta de capacitação de profissionais não especialistas em oncologia . Essas jovens podem chegar a um estágio avançado, tendo uma lesão que poderia ser identificada mais precocemente com a realização de um simples exame clínico das mamas na atenção primária. Sabemos que na pandemia esse cenário aumentou muito, já que os hospitais tiveram que dar preferência para os casos de Covid-19 Cirurgias que eram feitas há 20 anos, nas quais  se retirava ambos os músculos peitorais, agora estão voltando justamente pelo estágio avançado dos tumores de mulheres que tiveram dificuldade de acesso a serviços de saúde na pandemia. Quanto antes é sempre melhor. No tumor de até 2 cm, geralmente,  faz-se  uma cirurgia conservadora. Mas maior  do que isso pode ser necessário uma mastectomia. É importante destacar o papel da enfermagem nos postos de saúde. Porque um profissional devidamente treinado consegue identificar tumores de até 1 cm (T1). No auto exame geralmente as mulheres identificam de dois ou três cm. É claro que se tocar é ainda muito importante, mas não deve ser o único foco do Outubro Rosa. Prefiro, inclusive, trocar a expressão “auto exame” por “auto conhecimento”. As mulheres devem conhecer suas mamas para, que assim, possam identificar alterações. Mas devem entender que se conhecer não quer dizer que não precisam comparecer às consultas de saúde e que o rastreamento mamográfico não é necessário. 

Edvane: não é uma coisa simples. Apenas o Outubro Rosa é pouco pra essa discussão. Com exceção da região norte do Brasil, no restante dos estados federativos, o câncer de mama é o câncer de maior incidência.

Lelia: Concordo com a Samantha, falar sobre autoconhecimento em vez de autoexame equivale muito mais. Porque eu, como enfermeira, nunca fui treinada para fazer o exame clínico, então orientar as mulheres a fazer isso é muita responsabilidade. A mulher se sente muito culpada se não é capaz de identificar o tumor. É claro que no banho mesmo é possível identificar, mas não basta. O Outubro Rosa é muito importante mas está na hora da gente ter uma abordagem diferente porque enquanto existe toda uma relação do marketing com esse mês, do outro lado existem mulheres fazendo cirurgias para retirada da costela.

 

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Parte dos membros do projeto Acolhe-Onco participa de Congresso sobre combate ao câncer. 

 

Ao longo do nosso encontro com a professora Edvane estudantes  de diferentes áreas profissionais que formam a equipe multiprofissional fizeram uma apresentação sobre informações e orientações no câncer:

A fisioterapia focou em como a atividade física é importante na prevenção dos diferentes tipos de câncer e minimizar o efeito da radio, quimio e terapia hormonal.

Segundo os estudantes de fisioterapia, os programas de exercício têm que ser semanais com duração de 150 minutos em caso de atividade física moderada ou 75 minutos em caso de atividade física de alta intensidade. Eles afirmaram que as atividades que aumentam a frequência cardíaca são mais eficazes.

Os nutricionistas focaram nas orientações da UICC (Union for International Cancer Control) para alimentação. Eles indicaram consumo de cereais, frutas e verduras, evitar alimentos ultraprocessados, bebidas açucaradas e ingestão de bebida alcoólica. Recomendaram para as mães a amamentação sempre que possível, o que pode beneficiar tanto a mulher quanto o bebê.

As nutricionistas também comentaram sobre os mitos como o chá de graviola e suco de inhame para aumentar a imunidade e curar o câncer. Reforçaram a importância de deixarmos esses mitos de lado e buscarmos informações baseadas na ciência.

A farmácia comentou sobre a adesão terapêutica. No tratamento ao câncer existem dois tipos de remédios: os neoadjuvantes (pré operatórios) e os adjuvantes (pós operatórios). Não é só a cirurgia que ajuda a curar, por isso é importante a adesão da quimioterapia, e medicamentos gerais via oral. É importante respeitar o tempo recomendado na medicação e não parar com a medicação antes do indicado. Sempre no horário correto e com água. Evitando recaídas e recidivas da doença.

A odontologia comentou sobre o comprometimento oral depois da quimioterapia e da radioterapia. Durante o tratamento do câncer podem ocorrer problemas como a mucosite, infecção fúngica, xerostomia e ardência bucal. Antes do tratamento é importante passar no dentista e manter a higiene bucal durante todo o tratamento.

A assistência social afirmou a importância de salientar o papel do assistente dando informações sobre a prevenção e tratamento ao câncer, mas também na compreensão do contexto social, história e bagagem da família da/o paciente com câncer.

Para a psicologia é importante o acompanhamento desde o diagnóstico, não só do paciente mas de toda família. Um olhar psicossocial é muito importante no caminho para recuperação.

Por fim, a  enfermagem é responsável por todo o processo contínuo de cuidado, desde a prevenção até a sobrevivência. As enfermeiras e os enfermeiros orientam as mulheres  a  evitar os comportamentos de risco; evitar a obesidade; incentivar e apoiar a amamentação; combater o sedentarismo; combater o tabagismo; orientam contra a auto administração de hormônios sem acompanhamento médico; orientam  a realização de exames de detecção precoce; estimulam o autocuidado e o conhecimento sobre o próprio corpo. Enfermeiros e enfermeiras especialistas podem ser fatores fortalecedores para a equipe porque também incentivam e buscam qualificar toda a equipe por estarem presentes em tantas partes do processo. 

 

Instagram AcolheOnco: @acolheoncounifesp

Instagram Dra Samantha Rizzi: @dra_samantharizzi


Contato COREMU: Residência Multiprofissional (unifesp.br)